Na época certa, a mãe realizou uma ultrassonografia para ver como estava o filho. E então veio a notícia ruim. Havia alguma coisa de estranho com a criança. Foram feitos alguns estudos, pesquisaram várias possíveis doenças no feto, e acabaram por definir o que tinha. Grande parte do cérebro da criança não existia. Não era o que se chama de anencefalia, porque havia ainda uma parte da massa encefálica, mas o volume era muito pequeno. A equipe médica logo de cara acreditou inclusive que seria incompatível com a vida.
A família desabou. A mãe, principalmente, entrou num progressivo estado de depressão, que só fazia piorar a cada semana. A sugestão médica inicial foi de que a gravidez deveria ser interrompida. O pai foi a favor do procedimento e de solicitar juridicamente o pedido de aborto, mas a mãe foi contra. Apesar de saber que as chances de vida eram mínimas ou nulas, queria seguir com a gravidez até o fim, e o pai acabou por concordar.

Mas ela ultrapassou a expectativa negativa. Mesmo sem boa parte do cérebro, mesmo com o pulmão pouco formado, sobreviveu à primeira semana de vida com força o bastante para atravessar muitas outras lutas. A garota não teve como deixar o hospital em momento algum. E, depois de estar completamente estabilizada, embora ainda ligada a máquinas para conseguir manter as funções de alguns órgãos, teve condições de sair da UTI e ficar em um apartamento dentro do hospital, onde poderia receber maiores cuidados da família.
Não conseguia deglutir o leite da mãe, sendo alimentada por sonda. Não conseguia se comunicar ou abrir os olhos ou emitir qualquer ruído, mas parecia sentir quando havia o toque dos pais, pois o corpo parava de se agitar e dormia tranquila.
A garotinha tem hoje quase quatro anos. Contra todas as possibilidades, continua viva e forte, crescendo no descompasso de seu organismo, ainda alimentada por sonda, ainda respirando por máquinas... Ainda amada pelos pais, que diariamente estão ali ao seu lado, com o mesmo toque de quando nascera e a mesma segurança do dia em que decidiram não parar a gestação.
DENTRO DE MIM MORA UM ANJO é uma música de Sueli Costa